Pérolas da Aviação

Trabalhar num aeroporto é algo, no mínimo, curioso. É lidar com pressão de horários, passageiros estressados, trocas de turnos agitadas, escalas de trabalho loucas e muita, mas muita, gente maluca. Claro que, para não sucumbir, pois afinal são 10 anos nessa vida, procuro fazer minha pesquisa antropológica básica, sem jamais esquecer da limonada feita com os limões azedos que encontramos no meio do caminho, no dia-a-dia. Afinal, a gente ganha pouco, mas se diverte! Portanto recline o encosto de seu assento e sinta-se à vontade aqui no nosso Pérolas da Aviação. Aperte os cintos e... voe alto!



quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

CLÁSSICOS DAS ÚLTIMAS PALAVRAS – 7

Interessante a narração do Blog da Morte sobre algumas verdades sobre as quais preferimos não pensar no nosso dia-a-dia de trabalho...rs...

CLÁSSICOS DAS ÚLTIMAS PALAVRAS – 7

“ATENÇÃO, PASSAGEIROS, VAMOS ATERRISSAR”

Podem perguntar a qualquer piloto que eu ainda não levei: os dois momentos mais arriscados de um vôo são a decolagem e a aterrissagem. Geralmente acompanho TODOS os vôos de muito perto e posso confirmar: o negócio é brabo mesmo. Se não fosse o meu trabalho JAMAIS entraria em um avião. Sempre que acompanho uma decolagem e uma aterrisagem acho que alguém como eu virá ME buscar.

Pousos mal-sucedidos são um espetáculo da engenharia humana. Nada impressiona mais que a descida de um avião que começa numa pista de pouso e termina dentro de um supermercado ou um posto de gasolina. Por isto é que quando ouço as simpáticas últimas palavras “Atenção, passageiros, vamos aterrissar” até mesmo eu, a Morte, sente um friozinho na espinha.

Obviamente que há variações como “Atenção, senhores passageiros, apertem os cintos, e atentem para os procedimentos de aterrissagem” . Mas se houvesse uma forma mais completa, estaria seria “Atenção, senhores passageiros, vou tentar depositar 200 toneladas de metal, combustível, e carne humana, à velocidade de 500km/h sobre uma pista de asfalto e seja o que Deus quiser”, mas acho que isso não tranquilizaria muito vocês.

Ninguém poderia imaginar, mas quando Santos Dumont fez o 14 Bis decolar e pousar naquele fatídico ano de 1906, fiquei muito puto. Aquele inventorzinho nanico e afetado conseguiu estragar um dos maiores prazeres da minha vida que era ver vocês tentarem voar (e fracassarem, claro). Vocês tem os seus “Friends”, “Seinfeld”, “Grande Família”, eu não. Para mim nada superou em humor até hoje a história da aviação. Todos os anos eu levava pelo menos uns 300 de vocês em engenhocas cada vez mais ridículas em cenas de empacotamento hilárias! Que saudade…

Porém, em 1908, fui fazer um serviço de rotina buscando um tenente do exército americano que havia quebrado pelo menos 80% dos ossos do corpo. O acidente se deu numa máquina esquisita que eu nunca tinha visto antes. “Aquilo é um avião motorizado de asas fixas”, disse-me ele, “o primeiro modelo da história”. O sorriso então voltou novamente à minha face: o futuro estava nos acidentes aéreos, óbvio! Como eu não havia pensado nisso antes? Havia esperança. Com esta experiência aprendi que quando a vida fecha uma porta, uma janela se abre em algum lugar. E se for a janela de um avião que se abra a dez mil metros de altura, melhor ainda.

Talvez a a forma mais tranquila de se dizer “Atenção, senhores passageiros, vamos aterrissar” fosse a mais curta e mais simples: “Atenção, senhores passageiros, REZEM!”. Mas como mais da metade de vocês já fazem isso automaticamente, talvez, de fato, não seja preciso dizer.

Só sei que todas as vezes que ouço estas últimas palavras, eu saio da cabine de comando e vou para área dos tripulantes. Ali eu estico as pernas, faço um alongamento, um aquecimento, tomo um café. Porque, nunca se sabe, um serviço pode estourar a qualquer momento. Literalmente.

Ah, sim, aproveitando: fiquem tranquilos quando vocês não encontrarem a caixa-preta de um avião. Quando isso acontece é porque eu levei a fita pra estudar em casa, para melhorar minha performance nas próximas. Afinal, depois de tanto esforço pra se matarem, vocês merecem o melhor de mim.

Diretamente do http://diariodafoice.com

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